Wilane Oliveira saiu do Ceará para a Irlanda em 2007 para estudar. Lá, conheceu um português e se casou. Depois do período de intercâmbio, conseguiu arranjar um bom emprego na mesma área, no setor hoteleiro:
– A Irlanda era um país produtivo, com muitas oportunidades.
Com a crise econômica europeia, no entanto, as coisas começaram a mudar, ao mesmo tempo em que as notícias do Brasil, e particularmente do Ceará, ficavam mais animadoras.
– Eu e meu marido ficamos desempregados. As coisas foram ficando difíceis e a gente acabou vendo todos os nossos sonhos desaparecerem. Enquanto isso, o Brasil se transformou, está crescendo, e ainda vem a Copa do Mundo – conta.
Como Wilane, muitos brasileiros tomaram o mesmo rumo de volta para casa. E o estado que mais recebeu nativos de volta é o Ceará, segundo o Censo 2010, divulgados há duas semanas pelo IBGE. A pesquisa mostra que 47% dos que migraram para o estado eram, na verdade, cearenses voltando. Foram mais de 57 mil pessoas entre 2005 e 2010.
Na volta, Wilane trouxe o marido e os dois filhos. Hoje, o casal tem uma empresa de quentinhas na periferia de Fortaleza:
– E ainda estamos perto da família, do aconchego do lar.
O sociólogo Elcio Batista, da Universidade Federal do Ceará, explica que vários fatores contribuem para que o cearense retorne para seu lugar de origem:
– A economia do estado vive um ciclo virtuoso. O Ceará apresenta a maior taxa de crescimento do Nordeste. Há investimentos públicos e privados em educação, universidades. Escolas técnicas estão sendo construídas. Na saúde, temos a construção dos hospitais regionais.
Para Batista, ao mesmo tempo em que é uma boa notícia, a imigração de retorno também traz preocupações.
– A primeira é o forte impacto na prestação de serviços públicos para essa nova demanda populacional – diz. – Tem de haver planejamento e investimento em políticas para esse grupo.
O também microempresário Marcos Aurélio Almeida, de Senador Pompeu, no sertão cearense, tem uma relação de amor e ódio com São Paulo. Foi três vezes à maior metrópole da América do Sul. Na primeira, em 1988, trabalhou como caixa de padaria. “Queria juntar dinheiro e voltar logo”. Em dois meses, não conseguiu fazer economia, mas foi embora do mesmo jeito.
– O clima de lá não me agradou e não gostei da minha moradia – explica.
Em 1991, retornou para a “terra da garoa”. Passou cinco anos, guardou algum dinheiro e voltou para Senador Pompeu. Mas a empresa que ele abriu não deu certo. Foi para São Paulo pela terceira vez. Passou 12 anos trabalhando como gerente de padaria. Já tinha levado a mulher e formado família. Mas, quando já estava acostumado com a “nova moradia”, viu-se forçado a voltar:
– Fui assaltado duas vezes seguidas. A violência lá (em SP) é grande demais.
O sociólogo Elcio Batista aponta justamente o fato de a violência ser ainda menor no estado, assim como o trânsito, é também um dos fatores a atrair de volta cearenses:
– O trânsito das cidades cearenses é ainda bem menos intenso do que nas grandes metrópoles. E a violência é menor. Se o objetivo era conseguir uma vida melhor fora daqui, esses fatores estão fazendo as pessoas acreditarem no contrário.
Marcos Aurélio foi um desses a acreditar e, hoje, é dono de uma das maiores pizzarias do sertão do Ceará. Tem dez funcionários. O negócio é um sucesso.
– Não sei como passei tanto tempo longe do meu Ceará. É meu lugar. Estou perto dos meus amigos e nunca mais quero sair – diz. – O próximo passo é abrir outro estabelecimento.
A família da socióloga Paula Tesser resolveu passar um período na França, em 1994. Eles voltaram. Ela ficou. Fez mestrado e começou o doutorado. Casou-se e, depois do nascimento da filha, repensou a moradia.
– Senti muita falta de me relacionar com a família. O ritmo de vida parisiense é muito intenso – afirma Paula.
Depois de se tornar doutora, resolveu voltar para Fortaleza.
– Vários colegas meus estavam desempregados na França. E, em Fortaleza, o cenário era propício para mim. Várias faculdades particulares surgiam e eram uma ótima oportunidade de trabalho.
Hoje, ela leciona e estuda para concursos.
– Temos um nível de vida melhor e com mais qualidade porque estamos perto da família – conta, dizendo que nas horas vagas se dedica à música. – Na França eu também cantava, e a efervescência cultural de Fortaleza contribui para que eu continue fazendo o que gosto.
Fonte: O Globo
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